
AMOR familiar
Até pouco tempo atrás, se algumas pessoas fossem questionadas em relação ao termo “família” uma resposta quase instantânea é que “família’’ seria o casamento de um homem e uma mulher, cis, e os filhos que esse casal teria. Pois bem, isso também é uma forma de entender o conceito de família, mas com o passar do tempo a sociedade está compreendendo cada vez mais que “família” vai muito além do descrito acima.
Assim como observado no amor romântico, o amor familiar também pode ser muito amplo, tendo em vista que existem diversos formatos de famílias. Bem, talvez isso seja óbvio demais, até porque toda família tem suas individualidades em termos de tradições, valores, sobrenomes, entre outros fatores. Porém, a diversidade que está sendo levantada aqui vai além dessas características. Estamos falando sobre diversidade na estrutura das famílias, pois ela nem sempre será formada apenas por pessoas que se casaram ou por indivíduos que compartem laços sanguíneos.
No Censo de 2000 do IBGE foi constatada a existência de 11 laços de parentescos nos lares consultados, e no último Censo, de 2010, esse valor aumentou para 19 tipos diferentes de laços familiares. Essa mudança ocorre porque o conceito de ‘‘família tradicional’’, composta por um casal hétero e cis juntamente com seus filhos foi observada em 49,9% dos lares entrevistados. Em contrapartida aos outros 50,1% das famílias que são compostas por outros formatos.
O que chamamos hoje de “novas configurações de família” é algo que sempre existiu, mesmo que sem o aparato da lei para reconhecer e proteger essas configurações familiares. Apenas com a atualização da Constituição Federal em 1988, passaram a ser reconhecidas outras formas de família, tendo, portanto, seus direitos resguardados por lei. Isso porque quando falamos sobre direito da família temos que ter em vista toda a diversidade de famílias que podem existir. Sendo assim, as atuais configurações reconhecidas são:


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Família Informal: formada por uma união estável, tanto entre casais heterossexuais quanto homoafetivos.
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Família Monoparental: família formada por qualquer um dos pais e seus descendentes.
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Família Anaparental: família sem pais, formada apenas por irmãos.
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Família Unipessoal: família de uma pessoa só.
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Família Mosaico ou Reconstituída: pais que têm filhos e se separam, e eventualmente começam a viver com outra pessoa que também tem filhos de outros relacionamentos.
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Família Simultânea/Paralela: casos em que uma pessoa mantém duas relações ao mesmo tempo.
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Família Eudemonista: família afetiva, formada por uma parentalidade socioafetiva.
![]() Casal felizUm homem e uma mulher sorrindo em seu casamento. | ![]() Casal de mulheresUm casal de duas mulheres. Elas estão se abraçando e seus rostos estão bem coladinhos. |
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![]() Casal de homensUm casal de dois homens. Na imagem um está dando um beijo na testa do outro. | ![]() Casal bebendo caféCasal de dois velhinhos sentados rindo e bebendo café juntos. |
![]() Mãe e filho brincandoUma mãe e seu filho brincando no chão. | ![]() Pai e filhoUm pai carregando seu bebe no alto. Seus olhos estão se encontrando e ambos estão sorrindo. |
![]() Mãe e filhouma mãe abraçada de costas com seu filho. Ambos sorrindo e segurando as mãos. | ![]() Irmãos felizestrês irmãos abraçadas e sorrindo para a foto. |
![]() Meninas e floresduas irmãs abraçadas de costas admirando um campo de flores. | ![]() Crianças sorrindoum menino com suas duas irmãs abraçados e sorrindo |
![]() Modelos gêmeasirmãs gêmeas se abraçando | ![]() Garota lindaMulher negra, com seu belo cabelo black power, olhando diretamente para a foto. |
![]() Retrato de uma pessoa idosaSenhora idosa sorrindo enquanto apoia sua cabeça sobre seu braços. | ![]() Retratohomem olhando e sorrindo para a câmera. |
![]() Piquenique em FamíliaFamília fazendo um piquenique. Na imagem mostra uma criança com seu pai e madrasta e também sua mãe e padrasto. | ![]() Grande famíliaFamília andando na rua. A imagem mostra uma menininha andando de mãos dadas com sua mãe, seu pai, seu padrasto e também seu avó. |
![]() menina com mãe e madrastaImagem mostra uma jovem abraçada com sua mãe e sua madrata. | ![]() Família felizImagem mostra filha deitada no colo de sua pai e sua madrasta. E ao lado deles está a mãe e o padrasto da menina. |
![]() trisal mulherestrês mulheres deitadas e sorrindo | ![]() trisal de homenstrês homens se entreolhando e sorrindo |
![]() três mulheresimagem de três mulheres sorrindo, a imagem representa como se elas estivessem em um relacionamento | ![]() Amigas no marimagem de três amigas mulheres brincando e se divertindo no mar |
![]() Grupo de mãos dadasimagem de três pessoas dando as mãos | ![]() Velhos amigosimagem de quatro velhinhos, amigos, sentados em um banco |
![]() amigos unidosimagem de cinco amigos |
O advogado Adnan Advincula falou sobre as consequências das leis terem reconhecido esses diversos formatos de famílias. De acordo com ele, a partir do momento que é concedido a um determinado grupo de pessoas a legalidade de utilizar o termo ''família'', esses indivíduos passam a ter os mesmos direitos que qualquer casal hetero cis e seus filhos possuíam antigamente. Tais como direito de herança, compartilhamento de bens, possibilidade de adoção, etc...

Como Adnan bem disse, não importa qual o formato, contanto que exista amor e cuidado, deve sim ser considerada uma família, tanto pela sociedade, quanto pela legislação. Independente do gênero e orientação sexual do casal, eles podem tanto ter filhos biológicos, através de métodos tradicionais ou artificiais, quanto realizar uma adoção, contanto que cumpram com os requisitos necessários. Segundo os artigos referentes a adoção previstos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, até mesmo uma pessoa que não está em um relacionamento pode adotar e formar uma família com apenas um responsável.
Falando em adoção, Kauan, de 6 anos, e seus pais Rafael César e Luke Vidal, compartilham juntos um pouquinho de sua rotina cheia de amor nas redes sociais. Os influenciadores usam do humor pra relatar os casos diários, mas através de seus vídeos eles trazem muito mais do que apenas alegria para o público. Eles inspiram, representam e tentam combater preconceitos. Unidos em família eles mostram a realidade de dois pais na criação e educação de um filho, que por sua vez reflete, essa positividade através de uma personalidade doce e um comportamento repleto de amor e respeito.
Rafael diz em suas redes sociais que "através de vídeos e fotos gostaria de reafirmar que se você é LGBTQIAPN+ e sonha em ter uma família, saiba que você pode e deve. Família é onde tem amor e só isso que importa! O Kauan não tem vergonha de ter dois pais, mas mesmo assim, no começo tínhamos medo de nos tonar visíveis e alvos de preconceito. Mas o acolhimento das pessoas fez com que a gente continuasse a gravar vídeos. As pessoas gostam da nossa família e recebemos muitos feedback de pessoas que mudaram seus pensamento ou o pensamento de alguém próximo... e isso é muito gratificante!"

O graduando Thiago Fernandes mudou muito o seu conceito de família a partir do momento em que mudou-se para Viçosa - MG para cursar jornalismo. Lá, ele compreendeu que a família vai muito além do seu núcleo principal, abrangendo os seus amigos e atualmente a família que ele está construindo com o seu noivo e suas duas cachorrinhas.
"Minha família sempre se incomodava por eu ser uma pessoa muito quieta, pelos meus gostos, etc. Então, era uma coisa que eu achava muito tóxica, que eu preferia me manter distante. Mas, agora eu consegui trabalhar e melhorar meu entendimento do conceito de família. Porque, para mim, eu vejo família como as pessoas que me querem bem, as pessoas que gostam de conviver comigo, de ter uma boa relação comigo, de ter algum contato ou algum laço. Para mim, a família não tem que ser de sangue. Eu vejo, por exemplo, muitos amigos meus como meus familiares, porque são pessoas muito queridas para mim. Outra parte também que eu procuro trabalhar no sentido de família é a questão dos meus cachorrinhos, a questão do meu noivo. Porque compartilhar espaços com eles, compartilhar sentimentos, isso pra mim é uma construção de família nova também e que eu tô procurando desenvolver e que eu acho uma coisa incrível! Claro que tem os altos e baixos de ter cachorros, de ter um relacionamento… o que é normal! Mas a gente sabe que tem uma base muito boa e sólida no amor, no companheirismo, na amizade e é assim que eu vou construir o conceito de amor familiar."
Assim como Thiago, a estudante Ellen Schittini considera seus amigos como a família que ela escolheu. Independente de não ser uma família convencional ela não imagina sua vida sem eles.
Núbia Kekerê também compartilha do mesmo pensamento e afirma que desde o momento em que entrou em sua república, na época da faculdade, ela encontrou lá um amor inexplicável, pelo lugar e pelas pessoas. Ela considera todas as suas companheiras de república como uma grande família, que se apoiam e crescem juntas.
"Lá eu consegui me construir e desenvolver pessoalmente
de uma maneira muito impressionante. É algo que eu não
consigo nem descrever em palavras o quanto me mudou e
me marca até hoje. Cada uma das meninas que moram comigo me ensinou e me fez crescer em diversos aspectos da minha vida. Eu posso dizer que amo muito aquela república, as pessoas que fazem parte de sua história e
as pessoas que moram comigo e estão fazendo nossa história lá. E eu sei que vão estar dentro do meu coração e nas minhas melhores memórias para sempre!"


"Sinto que nossa relação e conexão são de outras vidas. É um amor puro e muito
lindo, baseado em respeito e gratidão. Meus amigos são meu porto seguro, são
eles quem eu procuro nos piores momentos e são eles que estão presentes nos
melhores momentos também. Minha vida sem eles não seria a mesma, crescemos
juntos e amadurecemos juntos. Sendo assim, parte de quem sou hoje eu devo muito
muito a eles. Acredito que juntos construímos a nossa personalidade e o nosso senso do que é certo e do que é errado. Além disso, eu sei que com eles eu posso ser quem eu sou, contar sobre a minha vida, minhas decisões e meus erros... E sei que eu irei receber o apoio deles, ajuda e também puxões de orelha, caso for necessário."



Levando em conta toda essa diversidade nas estruturas familiares, comemorar o dia dos pais e dia das mães nas escolas com o tempo veio se tornando um assunto a se pensar, tendo em vista que o ambiente familiar das crianças nem sempre é composto apenas por pai e mãe. Segundo a Psicopedagoga Marinei Reis, a verdadeira realidade dos estudantes do ensino infantil é que suas famílias são bem diversificadas "tem caso de criança que a mãe mora em outro lugar, criança que o pai vem ver muito pouco, criança com os pais separados... Com isso escolas pensaram em criar um dia especial para a Família."
Toda escola possui seu Projeto Político Pedagógico - PPP, que é responsável por formular as diretrizes do ensino daquela respectiva instituição. Ele é reformulado de tempos em tempos e as escolas, por sua vez, discutem em coletivo o que precisa ser renovado no documento, tendo em vista as mudanças da sociedade. Um dos pontos que se trata dentro desse documento são as datas comemorativas, na qual as escolas elaboraram modificações para esse assunto e demais temáticas que abordam a diversidade de famílias.
Na resolução atual, algumas escolas comemoram o dia dos pais e o dia da mães, mas a maioria das escolas, segundo Marinei, comemoram o dia da família, englobando assim toda a multiplicidade das configurações familiares. Além de ensinar, claro, para as crianças a importância da diversidade e do respeito.
A psicopedagoga explica que não é simplesmente comemorar apenas o dia da família e ignorar a comemoração do dia dos pais e dos dias das mães.
As datas elas são comemorativas, são datas comerciais. Se a criança ligar a televisão ela vai ver sobre essas datas... dia das mães, dos pais. Por isso, eu trabalho no sentido de que todo dia é um dia especial para poder comemorar com a pessoa que a gente ama. Na minha sala, por exemplo, eu peço para que as crianças escrevam uma cartinha, para elogiar e contar seus sentimentos a família... seja a mãe, o pai, o avô, o padrasto, a tia...

Por conta da diversidade das famílias, Marinei busca ensinar para as crianças sobre respeito de uma forma lúdica. De acordo com a faixa etária da criança é utilizado uma linguagem própria para que ela entenda o conteúdo a ser tratado. Neste sentido, um artifício muito utilizado pelas educadoras são os livros infantis. Um exemplo disso é a obra ''O Livro da Família'' do autor Todd Parr, que ilustra as diversas famílias que podem existir, demonstrando que não importa como é o formato da sua família ou as características desta... O importante é o amor!
A professora de ensino infantil Helenita Silva realizou uma atividade com os alunos da Escola Municipal Abílio Gomes, em Betim - MG, na qual cada criança deveria ilustrar todas as pessoas que elas consideravam que faziam parte de sua família. É possível ver, através das ilustrações, que as crianças já compreendem o conceito de família de uma forma muito mais ampla do que apenas um núcleo de mãe, pai e filhos.
















![]() Donos com seu cachorro | ![]() mulher que abraça seu cão | ![]() papagaio |
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![]() menina fazendo carinho em duas cabras | ![]() Um casal com um cachorro e um gato | ![]() Família com animais de estimação |
![]() Mulher e seus cães em um banco |
Quando falamos sobre estrutura familiar, podemos refletir sobre esse termo e abordar os papéis de gênero comumente designados aos indivíduos dentro de uma família ‘‘tradicional’’. A socióloga Nathalie Reis Itaboraí, com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Pnad-IBGE), analisou o contexto das mulheres brasileiras dentro de suas famílias, entre 1976 e 2012, tendo em vista uma perspectiva de classe e gênero. Em sua pesquisa ela observou que nos meados de 1960, as famílias tradicionais eram muito desiguais em questão de gênero. Esse cenário viu uma real mudança a partir de 1970, momento em que o homem deixou de ser o único provedor da família e a mulher ganhou mais flexibilidade quanto a obrigatoriedade social de seus deveres como dona de casa.
Podemos notar surgir em nossa sociedade a mudança de compreensão sobre alguns marcadores que perpassam essa relação e o conceito de família. Por exemplo, observamos que hoje em dia existe uma luta feminista que aos poucos vem construindo um contexto social no qual a mulher não é obrigada a desempenhar um papel como progenitora e dona de casa, enquanto o homem também não é necessariamente o provedor do sustento da casa e família. Todas essas mudanças estão relacionadas a um processo lento, mas contínuo, de ampliação das oportunidades das mulheres ao acesso à educação, à métodos contraceptivos, à oportunidades de emprego e demais outros artifícios que propiciam uma maior igualdade de gênero dentro das relações afetivas, familiares e, até mesmo, fora delas.
É possível observar o surgimento de famílias relativamente tradicionais, mas que quebram os antigos ideais e papéis desempenhados socialmente para cada gênero, assim como a diminuição de uma pressão para que as famílias gerem ou adotem crianças para serem seus herdeiros e descendentes. Neste novo contexto da sociedade contemporânea, até mesmo a incorporação de animais domésticos como membros afetivos da família já é uma realidade.
Isabela Lazzarotto, além de analista, é voluntária no projeto Gatinhos do Parque. Ela conta como os felinos entraram e começaram a fazer parte da sua vida e família, o que a influenciou a entrar no projeto que ajuda os gatos de rua.
''Minha vida com gatos começou 15 dias depois da morte do meu pai, em 2019. Nino chegou com pouco planejamento mas também chegou para ajudar a tampar o buraco no coração da minha família. Dizem que gatos absorvem nossa tristeza e eu senti isso com o Nino. Ele viveu só um ano com a gente, mas foi o que me manteve seguindo, pois todo dia tinha que levantar e cuidar dele. Quando ele se foi outro buraco se abriu no meu coração. Em 2020, 5 dias antes da quarentena começar eu fui buscar o Lucca. Um amarelinho que não curte colo, mas ama um carinho e ronrona como nenhum outro gato. Um mês depois busquei seu amigo de rua, o Luigi, um frajolinha que ama ser penteado e dorme nas minha pernas. Os dois tornaram o primeiro ano de pandemia menos cinza. Todo dia era uma história engraçada diferente.
Em 2021 dei lar temporário para três irmãs. Fui inocente em achar que nenhuma ficaria para sempre. Cora era a mais bagunceira, fugia toda hora. Assim ela foi ficando até proclamar-se dona da casa.''
Segundo ela, a relação com os animais é de uma troca tão sincera que fica difícil colocar em palavras. Os animais são companheiros muito fiéis quando confiam plenamente em alguém. E quando eles se tornam parte de nossas famílias, nossas histórias com eles são sem fim… cheia de amor e gratidão.
Essa gratidão é um elemento recorrente em relatos de pessoas que contam sobre seus amores familiares. Pois, independente de como a família é construída e constituída, se existe apoio e amor, elas definitivamente são válidas. No box abaixo você poderá conhecer a história de algumas pessoas e suas respectivas famílias.


Segundo a pesquisa Pnad-IBGE, em 1976, o percentual de mulheres casadas de 15 a 54 anos que trabalhavam era de: 25,4% na classe dos trabalhadores rurais e de 34,5% entre os profissionais com nível superior. Neste mesmo ano a pesquisa apontou que em 77% dos casais de trabalhadores rurais, o homem era o único provedor. E nos casais de profissionais com nível superior a porcentagem era de 63%.
Em 2012, os números mudaram um pouco, sendo 46,4% de trabalhadoras rurais e 75,5% de trabalhadoras com nível superior. E em relação aos homens como único provedor da casa, o cenário mudou para 50,5% em casais de trabalhadores rurais e 24,1% nos de nível superior.
